Damiana Bregalda, Universidade Federal do Amazonas, Brasil:
Este artigo parte da noção de dança enquanto metáfora e metonímia de modos de habitar a terra, de movimentos de produção e destruição de mundos. Propondo que o chão desta dança é chão do mundo, modos diversos de conceber e produzir corpos, de se relacionar com o chão e nele se mover são convocados. A partir de uma ideia ampliada de dança, articulada com dimensões políticas, históricas e sociais, o chão liso e lustroso da dança da modernidade passa a revelar as matérias fantasmas, os “corpos impropriamente enterrados da história” (Gordon qtd. em Lepecki, “Planos” 15), os fins que nunca acabaram (da escravidão que não terminou com o escravagismo, da colônia que não terminou com o colonialismo) (Lepecki, “Planos” 15), o passado que segue reverberando no presente em corpos humanos, não humanos, na paisagem, na terra. Diante disto, gestos políticos deliberados são necessários para desenterrar, como propõe Malcom Ferdinand (82), “os vestígios daqueles a quem o mundo foi recusado” na direção da construção de uma “política do chão” (Carter qtd. em Lepecki, “Coreopolítica” 47). Em diálogo com proposições e conceitos como os de cosmopolítica de Isabelle Stengers e Bruno Latour, de coreopolítica de André Lepecki e de geocoregrafia, de Carolina Caycedo, a noção de cosmocoreografia é apresentada como ferramenta a serviço da descrição de movimentos e fluxos de seres humanos e não humanos, visíveis e invisíveis num cosmos interligado, em mundos em disputa. Gestos cosmocoreográficos podem remeter desde aos fluxos e movimentos dos tempos míticos, que grafaram formas hoje visíveis na paisagem e que ordenaram o mundo, a outros gestos e movimentos que conectam, compõem e recompõem corpos e territórios.